Jamil Mattar de Oliveira. Esse era o seu nome. Ainda me lembro do dia que o conheci. Olhar altivo, andar firme, respirava superioridade. Um homem que impressionava logo à primeira vista. Não precisava muito tempo para descobrir a sua grandiosidade, mas levaria tempo para conhecer quem ele era. Tinha muitas histórias para contar. Vez por outra repetia as histórias com a mesma precisão de detalhes da primeira vez que se ouvia. Era advogado, mais do que isso, um advogado que os grandes chamavam de "Professor". Aliás dizia-se na FMU (Faculdades Metopolitanas Unidas) em São Paulo onde lecionou direito constitucional por aproximadamente 40 anos, que em seu tempo não era possível se formar em direito sem passar pelo crivo do "Professor". Foi amigo de grandes homens da história do Brasil. Inúmeras vezes o ouvi contar de lições que aprendera diretamente do Presidente Juscelino Kubitschek. Implantou diversas faculdades por todo o país, inclusive a que estudei em São José dos Campos, a UNIVAP.
Aos 28 anos de idade, o garoto prodígio já era Presidente da Câmara de Vereadores de São José dos Campos. Contava com muito entusiasmo as façanhas da sua candidatura a prefeito da cidade na década de 1960. Citava grandes nomes da história com muita naturalidade. Grandiosidade fazia parte intrínseca da sua trajetória de vida pessoal e política. Ouvi muitas vezes contar de grandes batalhas judiciais que enfrentara ao longo de sua carreira como advogado. Era bonito de se ouvir. Talvez em outra ocasião eu reproduza algumas. Era um homem cheio de convicções, de opiniões claras e francas. "Não tenho papas na língua", dizia sempre. Não tinha medo de expor as suas opiniões. Gostava de interferir em tudo, não deixava escapara nenhuma oportunidade de expor as suas ideias. Me lembro de uma frase que sempre dizia: "para falar não se paga imposto". E seguia falando, instigando as pessoas ao seu redor a participar dos assuntos. Algumas vezes me perguntava sobre algo que eu não tinha a opinião formada. Então, me dizia sempre "Vou te dar de presente uma assinatura de jornal". Ainda conservava o velho hábito de ir à banca e folhear o jornal em papel. Não acreditava muito na Internet.
Era um grande sonhador. Algumas vezes, cheguei a afirmar que somente seria possível realizar tudo o que planejava se vivesse até os 120 anos. Tinha um coração generoso como ninguém. Adorava dar presentes. Me lembro de uma vez que tirou uma blusa que usava e me disse "essa é pra você". Jamil gostava de gente, acredita nas pessoas, não enxergava maldade em ninguém. De vez em quando trazia a memória alguém que o havia decepcionado e dizia: "Juscelino (dizendo do Presidente da República) me ensinou que existem três tipos de ingrato: o que esquece o favor recebido, o que cobra o favor recebido e o que vinga o favor recebido". Mas as pessoas que o decepcionaram não o impedia de seguir em frente acreditando nas pessoas. Era bonito isso.
Algumas vezes expressei publicamente a minha admiração pelo Doutor Jamil, um homem que sempre esteve envolvido no cenário político, se relacionou com grandes nomes da história do país em um período em que não se tinha a liberdade de expressão que temos hoje, mas passou ileso. Não teve nenhum incidente que "manchasse" a sua trajetória.
Apesar de tudo isso, por uma decisão pessoal, Jamil decide abandonar o cenário político e dedicar-se à causa do Evangelho. Tornou-se o Pastor Jamil, como orgulhosamente gostava de ser chamado. Abriu mão de toda a sua história para defender a causa de que a igreja deveria desempenhar o seu papel social. Foi aí que o conheci. Eu o chamava de "meu lendário amigo". Foi um período muito intenso. Um convívio de aproximadamente oito anos que transformou a minha forma de encarar o mundo. Tivemos muitas aventuras juntos. Como era bom contar com alguém que
acreditava em mim, que me motivava todos os dias a seguir em frente.
Não gostaria de terminar essa matéria assim, mas não há outra forma. Dois dias atrás, Jamil resolve ir embora, deixando pra trás uma grande parte dos seus sonhos. Faleceu aos 87 anos, de problemas cardíacos. Em minha visão, Jamil agora virou lenda.
Transcrevo aqui o texto que publiquei no Facebook assim que soube da sua morte:
"Perdi hoje uma parte da minha história. Chegou a hora da despedida do
homem que eu chamava de "Meu amigo lendário". Jamil Mattar de Oliveira,
esse era o seu nome. Eu o conheci em um momento de grande ansiedade em
minha história. Eu havia retornado ao Brasil depois de ficar dois meses
nos Estados Unidos, onde tive a oportunidade de mudar a minha visão
sobre a "obra missionária". Voltei cheio de sonhos e expectativas. Pr
Jamil resolveu acreditar nos meus sonhos e uma vez me disse:
"vamos viajar o Brasil inteiro fazendo a obra". Foi aí que comecei.
Foram os melhores anos do meu ministério. Como era bom contar com alguém
que acreditava em mim, que me motivava todos os dias a seguir em
frente. Vivemos muitas aventuras juntos. Foi um período muito intenso.
Se hoje sou alguém, se hoje tenho motivação para seguir em frente devo a
você "meu querido amigo lendário". Você "virou lenda". Talvez, o dia
que eu publicar o meu livro, alguém vai duvidar que você existiu, mas eu
tenho certeza... tudo o que vivemos juntos foi de verdade. Descanse em
paz, meu amigo. Nos encontraremos no céu."
Prometo guardar os seus ensinamentos e seguir em frente. O seu legado não vai ser sepultado. Tenho muito orgulho de tê-lo conhecido.
Vou retomar o Projeto e terminar de escrever o meu livro "Um homem lendário", uma homenagem a você, "meu lendário amigo".
Com pesar,
Helio Morais